quarta-feira, 11 de julho de 2007

Função de Artista

A Festa Literária é um evento multifacetado. Em meio a inúmeros transeuntes, um Artista brilha. No anonimato, à margem do evento, quase desapercebido pelos turistas sua participação é fundamental e sua atuação é tão precisa que delineia a geografia das ruas da bela cidade de Parati. Seus movimentos singelos, simples, olhar baixo, de uma pessoa que já viu muitas coisas, envergonhado, cabelos brancos, mãos calejadas, cheias de esparadrapo, pelo árduo serviço artístico, são algumas características físicas do Artista.

Sapatos sujos por uma camada rasa de pó, camisa suada e calçados levemente furados, ele nos diz que há muitas horas está trabalhando, mais ou menos quatro. São oito horas. O modo de falar lembra a simplicidade do Jeca Tatu, personagem de Monteiro Lobato. Ao mesmo tempo em que o Artista é experiente pela vivência é paradoxalmente juvenil no que tange ao conhecimento escolástico. Baixa escolaridade não é problema quando o espírito do Artista é grande. Ele compreende que seu trabalho é colaborar para que a festa esteja “organizadinha”.

- Artista! Não é um trabalho muito duro?
- Não é não senhor, fica tudo muito lindo, a gente tem prazer de trabalhar perto da praia e ver as pessoas contentes.

E quem não acha que ele tem razão? Trabalhar tendo ao redor uma paisagem paradisíaca como a de Parati, com praias, um centro histórico belíssimo e conservado, que abriga muita riqueza cultural é para de fato ninguém reclamar, tendo em mente os problemas da conurbação. Neste período de festa, passa-se a respirar literatura, uma diversidade cultural e que confronta pontos de vistas plurais, discussões complexas e pertinentes, mas Artista pouco conhece sobre isso. Ainda assim sem saber ele participa desse núcleo que tende a marginalizá-lo. E é por isso que o admiramos, ele trabalha, rala e poucos o vêem, mas mesmo assim ele insiste em sobreviver com sua obra.

Esta cidade é com certeza um lugar em que muitos gostariam de trabalhar, se obviamente fossem reconhecidos. Reconhecidos? Há um provérbio na filosofia que diz que as pessoas só se mantém vivas pelo impulso do reconhecimento observado da sociedade. Mas se o Artista não tem esse prestígio, o que o leva a querer viver sem o reconhecido da sua sociedade?

O olhar acurado do Artista nos deixa a resposta. Não é preciso haver reconhecimento, apenas continue a fazer o que acha que deve fazer e alguém um dia, talvez, notará seu trabalho. Há pessoas, por exemplo, que só tem reconhecimento em vida póstuma. Não é preciso esperar a morte para a redenção, mas atentar para as simples ações do cotidiano e das relações humanas já dignificam o modo de viver.

Ao observarmos o Artista, dependemos do referencial ao qual olhamos; para muitos de nós, ele é apenas mais um elemento pertencente a engrenagem da máquina harmônica da sociedade, o trabalho. Marx dizia que o trabalho é um mecanismo que insere o indivíduo na coletividade e o faz dar sentido à vida tirando-o de um dos processos de alienação.

O simples trabalho do Artista o faz sentir-se útil, e ele é, ao desconstruir a idéia do alienado social. Não é necessário fazer grandes realizações ou tecer discussões profundas. Varrer a calçada da rua ou a da nossa casa, já é a grande obra do Varredor, Funcionário público e Cidadão: Ronaldo Artista Nogueira.


terça-feira, 10 de julho de 2007

Bonecos dão um toque de criatividade

“A arte é um compêndio da natureza formado pela imaginação”.
Eça de Queirós


Uma tradição na FLIP são os bonecos de papel marche, construídos pelas crianças das escolas públicas da cidade, através de uma oficina ministrada pelos escultores locais. Os bonecos gigantes representam grandes clássicos da literatura. A idéia foi reeditada, com novos temas. Olhando atentamente a cidade, descobrimos, também, figuras do folclore brasileiro.

De acordo com os organizadores do evento, os bonecos são sempre sucesso na FLIP, o que podemos perceber nitidamente. Quando as crianças chegam à praça do centro histórico de Parati, ficam perplexas com o colorido e o tamanho dos bonecos. Ao verem que nem todos os bonecos são imóveis, querem logo saber como são feitos e como funcionam aqueles que se movem.

A técnica do papel marche é tradicional em Parati e muitas vezes é passada de pai para filho nos quintais. Em parceria com um programa educativo, os alunos da rede escolar aprendem, a partir das referências da literatura e da cultura local, a fazer os bonecos. Nas instalações, alguns bonecos montados em frente à Flipinha este ano são: Alice no País das Maravilhas, Cirandeiros de Parati, A Metamorfose (Kafka), Jeca Tatu, João e Maria na Casinha de Doces, o Saci, a Mula-sem-cabeça, dentre outros.

Durante a Flip, crianças e jovens de escolas públicas desfilam, pelas ruas da cidade, vestidos nos grandes bonecos que por eles são feitos. Aos turistas e curiosos é possível também vestir-se nos personagens e emergir na brincadeira e nesse mundo de fantasia que não é assim tão simples e ingênuo. A arte visa mostrar às crianças a riqueza presente nas obras e a problemática que envolve cada uma, levando o adulto e a criança à reflexão do que é observado.

A arte de comer

“Os maus vivem para comer e beber. Enquanto isso, os bons comem e bebem para viver”.
Sócrates


Aos que não desejam gastar muito com alimentação em Parati, é possível comer um pastel de 30 cm no centro histórico. Claro que ele não é tão barato assim, custa entre R$ 6 e 10 reais cada e varia de acordo com o recheio escolhido pelo cliente. Mas uma coisa é certa, ele sacia momentaneamente a fome da pessoa.

As crianças ficam meio desajeitadas, os mais velhos com vergonha de fazer sujeira em público, mas o fato é que todos querem provar a novidade. O sabor é muito agradável.

Mãe, Como é que eu faço?
Ora, pegue um papel, corte e tome cuidado para não....

Mas você derrubou...
Ah... Deixa pra lá. Coma o seu e me deixe quieta...
Ta bom o pastel, né? E eu nem fiz sujeira.

Show de Abertura

A abertura da quinta FLIP inicia-se com uma belíssima apresentação da Orquestra Imperial, que toca ritmos como: carnaval e funk, gafieira e soul, samba e bolero na Festa de Parati. Com músicas que trazem uma nostalgia aos mais experientes e inveja aos mais jovens, ela causa admiração pela leveza do som e bom tom das letras. A Orquestra é classificada por críticos da atualidade como um dos maiores coletivos de talentos contemporâneos da música brasileira.

Criada em 2002, a Orquestra conta com 18 integrantes. Entre eles músicos clássicos como Wilson das Neves, um dos maiores bateristas da história do MPB até revelações recentes, como Rodrigo Amarante (Los Hermanos), os três integrantes do grupo +2 (Moreno Veloso, Kassin e Domenico), as cantoras Thalma de Freitas, que participou de novelas da Rede Globo, e Nina Becker além do guitarrista Pedro de Sá. Um dos pontos fortes da apresentação é Bidu, o trombonista que nos prestigia com seus solos e, algumas vezes durante o show, brinda o público com sua voz em velhas marchinhas cantadas pela orquestra.

A banda trás para a apresentação, na Tenda da Matriz, o músico João Donato, um dos mais talentosos do país, em uma parceria inédita. Nascido no Acre, muda-se para o Rio de Janeiro e, com 15 anos, já cantava e fazia sucesso nas noites cariocas. Artífice da Bossa Nova, o pianista, arranjador e compositor não ficou preso ao gênero de banquinhos e barquinhos, sem nenhuma ofensa. Mas foi tocar jazz nos Estados Unidos.

Nos anos 60, conviveu com Herbie Mann e Wes Montgomery. Retornou ao Brasil em 72 e consolidou sua imagem de músico inquieto. Neste ano, Donato já fez turnê ao Japão e lançou dois CDs um solo e outro com o amigo Bud Shank. Em Parati o pianista mescla sua experiência e juventude com os a Orquestra Imperial evidenciando a harmonia musical dos estilos.

Encontramos mais informações no site da Orquestra

segunda-feira, 9 de julho de 2007

Simplesmente Artistas

O resultado dos trabalhos desenvolvidos pelas crianças, tais como: exposições de trabalhos, apresentações de teatro, música, oficinas de arte, literatura e um tapete verde para leitura, podem ser vistos na Tenda Azul. O objetivo é difundir a cultura e explorar a pluralidade das expressões artísticas existentes. Como pode ser visto na foto, o lixo que é retirado do mar por pescadores mostra a problemática da falta da consciência ecológica pelas pessoas.

Nos arredores da Tenda Azul, as crianças lêem debaixo dos “pés-de-livros”, árvores com livros pendurados, que resultam da parceria com editoras brasileiras para a ampliação do acervo da Biblioteca Azul, instalada na sede da Associação e que atende a comunidade de Parati. Neste lugar, as crianças ficam entretidas e curiosas com o fato de lerem de um modo diferente e em contato com a natureza.



As crianças no país da FLIPINHA

"Um país se faz com homens e livros".
Monteiro Lobato

Uma das atrações da Festa Literária de Parati é a Flipinha que é um local de encontro das atividades realizadas ao longo do ano pelo Programa Educativo Cirandas de Parati que mobiliza a rede escolar e a comunidade, visando incentivar a leitura e a valorização do patrimônio local.

Segundo o diretor de programação Cassiano Elek Machado, em 2007 a participação das escolas será 30% maior que em 2006, devido às parcerias. Neste ano, a Flipinha foca a preservação do patrimônio material e imaterial da cidade de Parati, por meio dos estudantes, orientados por professores, que colheram informações na comunidade e elegeram bens que inspiraram instalações e apresentações artísticas.

A FLIP como ela foi


A partir de hoje, este blog se encarregará de fazer a cobertura da FLIP, Festa Literária Internacional de Parati que acontece do dia 4 a 8 de julho. Você, que visita o blog neste instante, deve estar se perguntando, mas porque só agora esse cara resolve falar da FLIP?

Assim posto, respondo: o jornalista que fala aqui não dispõe de recursos tecnológicos avançados como um notebook e internet, muito menos tem credencial para o evento. Portanto, o foco da abordagem terá um viés periférico da grande mídia e atentarei para o olhar não só do universo dos escritores, mas das pessoas que colaboram para o sucesso do evento. Desse modo, a pluralidade de acontecimentos e de pessoas será o fio condutor da viagem até tal cidade histórica do Rio de Janeiro.

E por que falar sobre a FLIP? Também digo. Evidenciar a literatura, a escrita, é algo importante em um país de tão poucos leitores assíduos, mostrar a cultura e o prazer por ler para os cidadãos deve ser fundamental não somente por nós jornalistas, mas estimulados por todos os preocupados com a educação, para engendrarmos uma sociedade forte e coesa do ponto de vista intelectual.

O homenageado desta quinta edição da FLIP é Nelson Rodrigues – jornalista, dramaturgo e cronista – que dispensa comentários devido a sua produção ser conhecida pela qualidade e riqueza de sentidos, trabalhando com acuracidade acerca da vida urbana.


“Chegou às redações a notícia da minha morte. E os bons colegas trataram de fazer a notícia. Se é verdade o que de mim disseram os necrológios, com a generosa abundância de todos os necrológios, sou de fato um bom sujeito.”
Nelson Rodrigues
(In: Ruy Castro, extraída do livro "Flor de Obsessão", 1997)